Dra. Socorro Martins comenta sobre a suspensão da vacina contra Covid-19 em adolescentes sem comorbidade

Até o momento, mais de 14 países já vacinaram milhões de adolescentes e o Brasil pretende imunizar em torno de 20 milhões com a vacina da Pfizer contra a COVID-19. A doença apresenta um risco substancialmente menor de formas graves, hospitalizações e mortes para eles, mas é  justamente nessa faixa etária que é mais frequente um dos raros eventos adversos da vacina da Pfizer, a miocardite (uma inflamação do músculo cardíaco), ocorrendo em cerca de 63 casos a cada um milhão de segunda dose de vacinas  aplicadas em meninos de 12 a  17 anos; a ocorrência é bem inferior para as meninas, onde temos estimado  oito casos para um milhão de segundas doses aplicadas.

Como não dispomos ainda de estudos robustos e conclusivos aqui no Brasil sobre o tema abordado, nos referenciamos pela experiência de países como os EUA, Canadá e Israel que administraram a vacina da Pfizer para essa faixa etária em milhões de pessoas e evidenciaram que miocardite pós-vacina realmente é mais comum nesta idade, porém é 30 vezes mais rara do que a miocardite causada pela própria doença nessa mesma faixa etária.

Recente análise conduzida pelo ACIP (Advisory Comnittee on Immunization Practices), órgão responsável pelas recomendações de vacinação nos EUA, comparou os riscos e os benefícios  oferecidos  pela imunização com as vacinas de RNAm ( Pfizer e Moderna) em adolescentes de 12 a 17 anos no contexto epidemiológico americano,  e a conclusão foi que os benefícios da vacinação (prevenção de casos, hospitalizações e mortes) superavam em muito os riscos ( ocorrência de casos de miocardite) em todos os grupos etários em que a vacinação está recomendada.

Importante que seja ressaltado que os casos de miocardite observados por evento adverso das vacinas de RNAm para a Covid -19, têm sido quase sempre muito menos grave do que aqueles causados pela própria doença, necessitando menos dias de internamento, só 1,5% dos casos chegando a necessitar de UTI, praticamente todos os casos até então registrados não deixaram sequelas e sem uma única morte confirmada até o momento decorrente da miocardite pós-vacinação. Contextualizando para a realidade brasileira, cabe lembrar que, assim como muitas outras doenças pediátricas, mesmo sem levar em conta a subnotificação de casos, a taxa mortalidade brasileira chega a ser Até 15 vezes maior em relação a alguns países. Mesmo com números de óbitos bem menores países com EUA e Reino Unido aprovaram a vacinação de adolescentes.

Os dados atuais compilados dentro do nosso país, corroboram com a importância da vacinação dos adolescentes, apesar de diversos estudos oriundos de vários países estimarem que o número de casos de Covid-19 na faixa pediátrica seja de 1% a 5% do total de casos confirmados e na grande maioria apresentem formas leves ou assintomáticas, crianças e adolescentes não estão isentos da ocorrência de formas graves como a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e a Síndrome Inflamatória  Multissistêmica, além dos casos da covid-19 longa e suas consequências, especialmente em relação aos aspectos cognitivos envolvendo o aprendizado. A Covid-19 é responsável no Brasil por uma fatia da mortalidade das crianças maior que todas as outras doenças imunopreveníveis juntas, perfazendo um total de 2.416 óbitos reportados no último boletim

epidemiológico do Ministério da saúde contabilizados ao total do ano anterior, o que demonstra um importante impacto da doença nessas faixas etárias.

Temos um estudo nacional onde foi detectado fatores associados a um maior risco de morte por covid-19 em menores de 2 anos, assim como a associação com doenças de base, fatores geopolíticos e etnia indígena.

Não podemos esquecer também que para o controle da cadeia de transmissão da doença é necessária uma ampla cobertura vacinal para todas as faixas etárias contempladas pelas vacinas licenciadas no país e que o PNI contempla atualmente a vacinação dos adolescentes de 12 a 17 anos com deficiências permanentes, com comorbidades, gestantes, puérpera e lactantes dentro dessa faixa etária e os privados de liberdade.

Esperamos que a vacinação dos adolescentes de 12 a 15 anos sem comorbidades aconteça, assim que todo o escalonamento das prioridades (terceira dose do imussuprimidos, reforço para os idosos e profissionais da saúde) e que todas as pessoas acima de 18 anos com ou sem comorbidades sejam alcançados com a imunização plena. Até lá, provavelmente poderemos ter trabalhos finalizados com a população de adolescentes com outros imunizantes o que ajudará com a aceleração e o avanço da vacinação em nosso país que concorrerá com altas e homogêneas coberturas vacinais.

Maria do Socorro F. Martins

Presidente do Comitê de Imunizações da Sociedade Paraibana de Pediatria